Wednesday, November 12, 2008

Lição de piano


Aprendi a ler bem cedo, com cinco anos, ensinada por uma babá que estudava para ser professora; praticávamos em jornais, ela querendo treinar a didática e eu, louca para decifrar aquele emaranhado de símbolos no papel.
E um pouco depois, aprendi a decifrar os símbolos da música: a pauta, a semínima, a semibreve, o dó, o sol, o lá...

Minha primeira professora de piano foi minha querida tia Terezinha, que vendo minha inclinação e amor pela música e dizendo que eu tinha uma "ótimo ouvido", me introduziu nesse universo. Como minha família não podia comprar um piano, ia todas as tardes (e às vezes passava lá os fins-de-semana) estudar no instrumento que ela mantinha em casa, onde dava aula para algumas crianças.

Escalas, exercícios, melodias singelas para quem está tentando colocar os dez dedos sobre uma infinidade de teclas brancas e pretas; estudei durante dois anos com ela e já tinha dominado a leitura da pauta, meu primeiro livro com partituras foi o "Novas Aventuras no País do Som", de Margaret E. Steward.

A seguir, ela me inscreveu no Belas Artes (hoje Instituto de Artes da UFRGS), onde comecei um curso introdutório, que na verdade, só reforçou o que já tinha aprendido.
A imagem mais forte que tenho desse período é de uma pequena banda que formávamos, com vários instrumentos, com os quais podíamos improvisar e brincar à vontade; depois as aulas de teoria, solfejo, piano e o estudo começou a ficar sério, até exaustivo.
Quando meu pai conseguiu alugar um piano (semi-novo, preto, com dois castiçais dourados incrustrados na madeira), foi a glória! Chegava da escola ao meio-dia, almoçava e ficava quase toda a tarde tocando.
Quando adulta, ganhei um piano de um tio que comoveu-se com o meu ardoroso pedido mas, infelizmente, tive que vendê-lo depois, numa fase de "vacas magras"...
Ainda sonho em ter um, novamente.

Entrando no curso Fundamental, fiquei até o quarto ano (1967), quando iniciou o meu processo de rebeldia adolescente e perdi a vontade de ficar horas e horas estudando escalas e exercícios técnicos: queria mais era ouvir Beatles, Jonhny Rivers, Rolling Stones, Jovem Guarda, Mutantes, Liverpool, ir a reuniões dançantes e beber cuba-libre escondida.
Tinha certeza que não ia ser uma concertista, que era a meta principal dos jovens que estudavam no Belas Artes, apesar de todo o empenho e estímulo dos ótimos professores que tive, como Zuleika Rosa Guedes e Norma Appel Bojunga.
No final do ano, tínhamos uma apresentação com todos os alunos e cada um selecionava uma peça, que era exaustivamente trabalhada para ser tocada em público. Ficava muito preocupada com essas apresentações, pois a música erudita não permite falhas, improvisos, deslizes, temos que executar impecavelmente a partitura.

Esse programa foi de uma apresentação em 1966:





Em 1975, iniciei o curso de Composição e Regência do Insituto, pensando em desenvolver meus conhecimentos teóricos, mas tive uma decepção porque o currículo era fraquíssimo, pelo menos nos dois primeiros anos em que fiquei lá: para cursá-lo, o aluno não precisava ler música, não exigiam exames práticos (tive que aguentar aulas explicando o que era uma pauta, uma clave de sol...), enfim, foi um monótono replay e não houve motivação suficiente para prosseguir.

Mas, definitivamente, não era meu caminho: queria cantar e, junto à Nara (que tocava violão) aprendia todos os sucessos, tirados daquelas revistinhas com cifras. Cantávamos em casa, na escola, nas festas, num ensaio do que viria pela frente, nossa performance no Boogaloo.
Meus pais ficaram muito chateados porque abandonei o curso de música, mas não imaginavam que isso não queria dizer que eu tinha abandonado a música...

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